30.1.07

lâmina


e quando menos se espera, acontece uma outra vez. palavras. promessas. tapete vermelho, estendido por metros, tornando o chão macio. sem obstáculos. maquiando a terra, imunda, que existe por baixo dos sapatos. sempre assim. de repente. quando menos se espera, o caminho, que parecia levar para um lado, oferece outro fim. morro por isso. mais uma vez. por acreditar no que havia me garantido. mentiras entre sorrisos. morro mais uma vez por não imaginar que suas mãos me traziam até aqui. guilhotina. cabeça apoiada, mãos acorrentadas, morro mais uma vez com a queda repentina desta lâmina. golpe que me divide em dois.

24.1.07

anátema


"com meu bisturi, lacero seu peito: amor. rasgo suas costas, minha mão ao mesmo tempo delicada e firme: amor. secciono seu rosto: amor. exponho seus músculos, arranho seus ossos, liberto seu sangue. amor."


[trecho de anátema, em cartaz no sesc paulista. vá ver]

6.1.07

medo


eu tenho um medo. guardado na gaveta de baixo, bem no fundo, com corrente e cadeado. eu tenho um medo trancado. debaixo das revistas velhas. dos cadernos usados. dos livros já lidos. dos papéis amarrotados. eu tenho um medo escondido. pior que de escuro, lugar alto, homem do saco. um medo segredo. o mesmo, desde pequeno. desde a oração cochichada. da febre sob as cobertas. do sinal da cruz no meio da noite. o mesmo desde sempre. um medo que me persegue. me atormenta. me atrapalha. que aparece no canto do quarto. no abrir dos armários. em vulto pelos corredores. em visão pela casa vazia. miragem pela praia deserta. ruído no meio do silêncio. grito durante a madrugada. eu tenho um medo morto. ressucitado. um medo tantas vezes enterrado. mas que sempre volta. que cava a terra ao contrário. para acabar comigo e ser mais uma vez trancado. escondido na gaveta de baixo, com corrente e cadeado. um medo que sempre escapa. foge. eu tenho um medo que sempre espera minha chegada, sorrindo. bem no meio da sala.